26 de nov. de 2013

(In)Cretinice (a)temporal

Estávamos andando com pressa por aí, vagando pela noite, na nossa própria velocidade. Apontei para que você pudesse ver meus prédios preferidos, espalhados naquele canto estranho da cidade. Você olhava e falava da estrutura, falava do tamanho, falava de arquitetura. E falava, e falava, e falava...
O frio nos consumia despercebidamente, até que então você me congela ao dizer que nunca tem tempo para nada. Como se fosse possível nunca ter tempo pra nada.
“Você tem tempo para respirar?” Perguntei.
Vi seu olhar deslizando de um lado para o outro. Seus olhos tinham um brilho confuso enquanto você mordia o canto da sua boca com uma leveza nervosa.
“Claro que sim” você respondeu com uma dificuldade estranha. Como se junto das suas palavras escapasse uma enorme bolha de ar, como se eu fosse o portador da pergunta mais difícil que alguém um dia te fez. “De fato, eu tenho tempo para respirar”, concluiu você com determinação, como se você estivesse em um jogo e a sua resposta tivesse um valor inestimável.
Havia um nervosismo alternando entre nós, e se estivéssemos amarrados naquele instante, certamente nossos nós estariam bem apertados.
Fingi não perceber seja lá o que você estivesse sentindo. Estava mais preocupado com as sensações que me percorriam, eu só queria parecer normal. Respondi com uma espécie de tranquilidade:
“Se é assim, então você não precisa se preocupar com mais nada. Você tem tempo pra fazer o que te faz viver. Agora relaxa tua mente.”
Então você me sorri (um sorriso que nem de longe é teu melhor sorriso), e eu concluo como você se livra de tanta coisa por ‘não ter tempo’. Você se livra de gente. Você se livra de afeições, de superficialidades, de sensações. Você se livra do apego pessoal, e se você não sentiu falta disso ainda, parabéns, você não sabe o quanto de sorte que você tem. Você se livra de se aventurar em algo que vai te machucar física e mentalmente. Você nunca vai precisar de forças, pois você simplesmente não tem nada pra te derrubar.
E essa tolice que eu disse fez com que seus olhos ardessem. Como se eu tivesse contado meu maior segredo. Como se eu tivesse te mostrado alguma fórmula secreta que solucionasse todos os seus problemas. Mas ainda tinha uma coisa que eu podia falar, e falei:
“Vive a tua vida no ritmo da tua respiração. Se for muito lenta, tu vai sentir sufocar. Se for muito rápida tu vai sentir como se te faltasse ar.”
Mas foi só uma tolice, palavras tolas. E eu sentia que teus olhos estavam colados em mim. A única forma de tudo ficar pior era alguém chegar e tocar uma daquelas músicas tristes, daquelas que só servem para caluniar cada vestígio de sensatez que ainda vaga sem rumo nas nossas mentes de vez em quando.
Eu ainda tinha muito pra dizer naquela noite, um 'muito' que eu não disse durante várias outras noites que se passaram ou se seguiram. Um 'muito' que talvez justificasse para mim o fervor quase voluptuoso dos teus olhos. Mas me faltou cretinice. Sobrou caretice. Faltou escrotice.
(Você respirar, lenta ou rapidamente, me faz bem.)
Faltou atrevimento. Faltou coragem. Faltou cretinice.

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